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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Uma mulher cresce no Brasil


29/09/2010
International Herald Tribune

NYTimes.com
Luisita Lopez Torregrosa
Analistas creditam a ascensão de Dilma em parte à economia acelerada e à expansão da ajuda para famílias de baixa renda 

Analistas creditam a ascensão de Dilma em parte à economia acelerada e à expansão da ajuda para famílias de baixa renda
     A América Latina não é estranha a líderes do sexo feminino, mas são poucas que podem se equiparar com a trajetória política radical de Dilma Rousseff, ex-líder guerrilheira marxista de 62 anos de idade que pode ser a primeira presidente do sexo feminino no Brasil.  
     Seria um momento suficientemente histórico se Rousseff, economista que se divorciou duas vezes, tornar-se presidente do Brasil –vencendo as eleições no domingo (3) em primeiro turno ou no segundo. Mas além disso, governaria um país com a oitava economia do mundo, o mais rico da América Latina.  
     O Brasil sempre foi um parque de diversão exótico, cuja política costuma envolver corrupção, violência e revolta. Mas atualmente é um ator na arena mundial; uma potência global.  
     Até um ano atrás, Rousseff, ex-ministra da Casa Civil do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, trabalhava na maior parte por trás das cenas, uma servidora eficiente e respeitada pela maioria, na sombra do presidente universalmente popular conhecido como Lula. Proibido por lei de concorrer a um terceiro mandato, Lula escolheu Rousseff, lançou sua aura em torno dela e se tornou o seu mais apaixonado cabo eleitoral.  
     Desvalorizada no mundo da política eleitoral brasileiro dominado pelos homens, Rousseff começou devagar no ano passado, em grande parte porque estava se tratando de um linfoma. Ela entrou com força total na campanha na primavera e ultrapassou seu principal oponente, o ex-governador de São Paulo José Serra, que perdeu para Lula na disputa presidencial em 2002. Rousseff teve uma campanha tranquila até o início do mês, quando a mídia divulgou denúncias que a família de uma ex-assistente, Erenice Guerra, que a sucedeu como ministra da Casa Civil, estava aceitando suborno para ajudar as empresas a fecharem contratos com o governo. Rousseff não foi mencionada nas acusações; desde então, ela cambaleou nas pesquisas, mas ainda está na dianteira.  
     Se sua campanha tem algum tema, é sua lealdade às políticas de Lula. “Orgulho-me de estar associada ao governo do presidente Lula, porque demonstramos que a distribuição de renda era uma condição necessária para tornar o Brasil independente e alcançar a estabilidade”, disse ela na semana passada durante um debate transmitido pela televisão em Brasília. Ela enfatizou que o Brasil –que tem, entre outras coisas, novos campos de petróleo descobertos na costa- não precisa mais de assistência de fora para cumprir suas obrigações externas.  
     A vitória faria Rousseff ingressar na galeria de líderes do sexo feminino na América Latina que, na maior parte –como suas contrapartes na Europa Ocidental e nos EUA- vem de famílias relativamente privilegiadas e educadas (diferentemente de Lula, que saiu da pobreza). Entre as latino-americanas de sucesso está Michelle Bachelet, 59, a primeira mulher presidente do Chile, mãe solteira de três filhos e pediatra, que sobreviveu à tortura na prisão, exílio e o regime de Pinochet para atingir a presidência em 2006. Ela permaneceu no cargo até março deste ano.  
     Bachelet voltou às manchetes recentemente com o anúncio que ia chefiar a nova agência da Organização das Nações Unidas chamada ONU Mulheres. “As mulheres são quase invisíveis em alguns lugares”, disse Bachelet na ONU na última quinta-feira. “São cidadãs de segunda classe. São vistas como pessoas sem direitos. Isso é uma vergonha para a humanidade”.  
     Enquanto Bachelet quebra as barreiras para as mulheres, Cristina Fernandez de Kirchner, 57, presidente da Argentina e mulher do ex-presidente Nestor Kirchner, batalhou por direitos gays, apoiando com sucesso o casamento de mesmo sexo. Cristina, peronista como o marido, pode parecer meio errática, usando políticas econômicas não ortodoxas, levantando o nariz para o Fundo Monetário Internacional e com poucos laços financeiros com o resto do mundo. Mas a economia argentina está prosperando, seu índice de aprovação está subindo, e ela pode vencer um segundo mandato no próximo ano.  
     No Peru, Keiko Fujimori, 35, filha do ex-presidente Alberto Fujimori, defende a estrutura capitalista que reforçou a economia do Peru. Apesar do pai dela estar na prisão, uma pesquisa feita em setembro mostrou que Keiko está na frente dos três oponentes potenciais –todos homens- para as eleições presidenciais da próxima primavera.  
     A política econômica pragmática do Brasil, que Rousseff fomentou nos quase 10 anos de governo Lula, ajudou a empurrá-la para a presidência. Ela disse que o Brasil pode continuar crescendo a uma taxa de 7% ao ano, que ela vai criar milhões de empregos, melhorar a infra-estrutura e usar a nova riqueza do Brasil para promover políticas de bem estar social e políticas de mercado.  
     Esse discurso capitalista parece distante dos dias que o nome de guerra de Rousseff era Stella, e ela usava armas e comandava camaradas. Por seu papel na resistência armada à ditadura militar nos anos 60 e 70, ela passou três anos na prisão, onde foi repetidamente torturada.  
     Rousseff foi criada em uma família de classe média alta em Belo Horizonte, no Estado de Minas Gerais. Seu pai, Pedro Rousseff, que morreu em 1962, nasceu na Bulgária como Petar Russev; sua mãe, Dilma Jane Silva, era filha de fazendeiros. A jovem Dilma frequentou internatos católicos, estudou piano e francês. Mas sua vida estruturada mudou quando foi para uma escola pública e descobriu o movimento subterrâneo. Era 1965 e ela tinha 17 anos.   
     Em poucos anos, entrou para a guerrilha, casou-se, impôs-se sobre os homens, divorciou-se, casou-se novamente e deu à luz a uma filha, sua única (desde então, se divorciou do segundo marido).  
     Fora da prisão, ela deixou a guerrilha e foi para a faculdade. Quando a democracia foi restaurada nos anos 80, ela tinha diploma de economia e se tornou secretária de energia do Rio Grande do Sul. Quando Lula foi eleito presidente, ela se tornou sua secretária de energia e depois, chefe da Casa Civil.
     Analistas creditam sua ascensão em parte à economia acelerada e à expansão da ajuda para famílias de baixa renda. Mas mais do que qualquer outro fator (inclusive o de ser mulher), Rousseff deve seu sucesso a Lula, que disse: “Ela não vai apenas preservar meu legado, mas aperfeiçoá-lo e fazer muito mais.”

Tradução: Deborah Weinberg

De:
http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/herald/2010/09/29/uma-mulher-cresce-no-brasil.jhtm

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