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quinta-feira, 19 de setembro de 2013

A Justiça contaminada

Por Luciano Martins Costa em 18/09/2013 na edição 764
Comentário para o programa radiofônico do Observatório, 18/9/2013
 Na quarta-feira (18/9), dia marcado para o desempate no julgamento da admissibilidade de recurso na Ação Penal 470, os jornais fazem um esforço derradeiro para impor sua tese: se o decano do Supremo Tribunal Federal, ministro Celso de Mello, votar a favor dos embargos, o Brasil terá caminhado para trás.
Essa á a mensagem que os diários oferecem a seus leitores, sem qualquer sutileza.
O esforço da imprensa para constranger o autor do voto decisivo não tem limites: o Globo chega a publicar, em sua página de opinião, um artigo do ministro Marco Aurélio Mello que, além de ser uma reiteração inapropriada de voto, insinua que, se rejeitar a hipótese do recurso, Celso de Mello estará prenunciando “novos tempos” na Justiça brasileira. Fica implícito, então, que o posicionamento contrário, ou seja, em favor da aceitação dos embargos, representaria a condenação do Judiciário a permanecer no limbo da História.
Afora o evidente mau gosto e demonstração de duvidosa ética que significa utilizar um meio de comunicação de massa para expor à execração pública outro ministro – o mais experiente da Corte –, Marco Aurélio Mello atropela os mais rudimentares princípios de isonomia entre os julgadores, ao se valer da imprensa para tentar impor sua opinião particular.
Mas isso é apenas parte da campanha que tenta transformar o Supremo Tribunal Federal em sucursal das redações de jornais. Em seu artigo no Globo, o ministro Marco Aurélio Mello levanta a hipótese de que, admitidos os embargos, a nova composição do tribunal possa produzir uma reviravolta no julgamento. Caso os novos integrantes do Supremo venham a se somar aos quatro ministros que foram vencidos nas sessões anteriores, “a condenação poderá ser transformada em absolvição, dando-se o dito pelo não dito, para a perplexidade geral”, diz o texto.
O que será que o ministro articulista quereria dizer com “perplexidade geral”? Pode-se entender que ele considera que a sociedade brasileira, de modo geral, estaria ansiosa pela condenação exemplar dos acusados, em pacote, como um ato de desagravo da Justiça por todos os julgamentos anteriores que produziram apenas impunidade, inclusive as liminares que concederam a liberdade a criminosos confessos.
O Direito e a política
Ora, pode-se afirmar, com base no senso comum, que a sociedade brasileira anseia por sinais de que o Judiciário é capaz de fazer Justiça, mas não há registro de uma opinião pública esmagadoramente coincidente, no caso da Ação Penal 470. Além disso, deve-se levar em conta que, desde 2005, ainda antes dos indiciamentos, a imprensa, quase unânime, vem fazendo a campanha pela condenação dos acusados, o que certamente teria influenciado a predominância de tal opinião.
Acontece que não é assim: o que o noticiário mais tem produzido sobre o assunto é desinformação.
Na edição de quarta-feira (18), a Folha de S. Paulo traz o resultado de uma pesquisa tão apressada quanto confusa, com 719 moradores de São Paulo, para afirmar que 55% dos paulistanos são contra um novo julgamento, mas 79% querem a prisão imediata dos condenados. O resultado da consulta é tão pateticamente impreciso que o próprio jornal se vê na obrigação de publicar, ao lado dos números, um texto do diretor-geral do Instituto Datafolha, no qual ele afirma que metade dos entrevistados não tinha conhecimento suficiente sobre o assunto que era objeto da pesquisa.
Ainda assim, o resultado virou manchete do jornal.
O texto que tenta validar o levantamento observa que há uma nítida divisão de opiniões de acordo com as idades, níveis de escolaridade e de renda, com os mais ricos e educados se colocando contra os recursos. “É claro que não se pode projetar sobre toda a população a posição de um subconjunto de peso quantitativo tão residual”, admite o diretor do Datafolha.
Em outras palavras, pode-se afirmar que a conclusão da pesquisa é definida por prováveis leitores do jornal, ou seja, a pesquisa completa um círculo que começa na própria Redação, embora a Folha tenha afirmado por meio de editorial, no dia 11/09, que é contra a pena de prisão dos acusados no chamado caso “mensalão” (ver aqui). 
Tal posicionamento parece contrariar a tendência do noticiário e da maioria dos artigos hospedados pelaFolha e os outros jornais, mas isso é apenas um aspecto da esquizofrenia que ataca a mídia: o resultado mais concreto da pesquisa Datafolha diz que a maior parte dos paulistanos considera ruim ou péssimo o desempenho do STF no episódio.
Portanto, o que faz mal ao Judiciário não é esta ou aquela decisão dos ministros: é a mistura entre Direito e política, promovida pela imprensa, que contamina a instituição da Justiça.
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Mídia joga decano Celso de Mello contra a parede


A decisão do presidente Joaquim Barbosa de suspender a sessão do STF, na semana passada, quando faltava apenas um voto, o do ministro Celso de Mello, para definir os rumos do julgamento do mensalão, tem suas explicações e alcançou plenamente seus objetivos para colocar em campo o trator da "opinião pública" contra a aceitação dos embargos infringentes.
Há quase uma semana não se fala de outro assunto em editoriais, colunas e blogs dos aliados de Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes, seus heróis. "Opinião pública", no caso, foi o papel assumido por amplos setores da mídia nacional reunidos no Instituto Millenium para jogar contra a parede o decano Celso de Mello e obrigá-lo a mudar seu voto a favor dos infringentes, como vem defendendo desde agosto do ano passado.
Como se imaginasse a manobra, o decano Mello foi até Barbosa, na última quinta-feira (12), para lhe informar que seu voto já estava pronto e não levaria mais de cinco minutos para fazer a sua leitura. O presidente do STF, no entanto, sempre tão apressado nas votações, desta vez foi irredutível: não poderia prolongar a sessão porque começaria outra em seguida, no  Tribunal Superior Eleitoral, do qual vários ministros participam. O TSE não poderia esperar mais cinco minutos?
O que aconteceu em seguida não foi apenas a orquestrada pressão de ministros do STF sobre o decano, manifestada em várias entrevistas, e a histeria da imprensa que quer ver logo os condenados na cadeia, mas um verdadeiro massacre contra a posição já manifestada por Celso de Mello, colocando nos seus ombros o futuro da Justiça no País.
"O Supremo decide amanhã o destino de 12 réus e o seu próprio destino", escreveu minha amiga Eliane Cantanhêde em sua coluna desta terça-feira na Folha, resumindo o que já publicaram seus colegas nestes últimos dias nos grandes jornais nacionais. Ou seja: ou Celso de Mello dá um cavalo de pau em suas convicções jurídicas e vota contra os infringentes ou será execrado pelo resto da vida como responsável pela desmoralização do Judiciário.
Nem se entra mais no mérito da questão jurídica, agora transformada em mera "tecnicalidade" a serviço da impunidade. Como se tivesse procuração para falar em nome do povo brasileiro, a imprensa acumula as funções de promotor e juiz, transformando o Supremo Tribunal Federal em mero executor das suas decisões editoriais. Como vimos há pouco, depois pode levar até 50 anos para que se arrependam delas, mas o importante agora é colocar José Dirceu e "a turma do PT" atrás das grades.
Desesperados diante da iminência de mais uma derrota, os porta-vozes da "opinião pública" não se importam em mandar às favas quaisquer escrúpulos. Como numa guerra sem quartel, o importante é vencer o inimigo, quer dizer, o partido que está há quase 11 anos no poder, contra a vontade desta mídia, que assumiu, por contra própria, o comando da oposição.
Nestas horas, a Constituição, as leis emanadas do Congresso Nacional e o regimento interno do STF, que embasam o voto de Celso de Mello, são apenas detalhes que podem atrapalhar a heroica cruzada midiática para atender aos anseios da "opinião pública", as duas palavras mágicas ressuscitadas para justificar os desatinos da rapaziada que não se conforma com o resultado previamente conhecido.
A manobra de Joaquim Barbosa, ao que tudo indica, serviu apenas para alimentar o barulho e adiar a frustração dos que passaram mais de um ano batalhando todos os dias para ver os réus petistas algemados, já que as urnas insistem em lhes ser madrastas.
É o que dá politizar a Justiça e judicializar a Política na tentativa de retomar o poder por outros meios. E confundir "opinião pública" com opinião publicada nos jornais.
Vida que segue.

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